Graças aos milagres da Internet e, em particular, a um extraordinário website  (www.medici.tv) musical que recomendo a todos os amantes de música e de ópera, estou fazendo uma esplêndida viagem virtual a São Petersburgo onde venho assistindo, desde o dia 17 de junho, na pequena e muito dourada sala da Filarmônica, ao concurso Tchaikovsky.  São quatro modalidades, piano, violino, violoncelo e voz. Impossível acompanhar todas, e faço portanto a escolha  natural para uma violoncelista. Nessa modalidade, como nas outras, de uma centena de candidatos, 25 são escolhidos em audições para a primeira fase – e já assistimos ao penoso corte de 13 desses 25 para a segunda fase. Na semana que vem, ficarão só 6 que concorrerão à classificação final.

O nível dos candidatos, que oscilam entre 20 e 30 anos, é impressionante. Wolfgang Boettcher, um dos membros do prestigiosíssimo júri comentou em entrevista que quando começou sua carreira, nos anos 50, não se tocava assim. É, como no esporte, o progresso da técnica e da acessibilidade aos instrumentos  de grande qualidade, assim como a maturidade e facilidade de aprendizado cada dia maior graças aos meios de comunicação e de transporte, que levam a informação e as pessoas aos quatro cantos do mundo, aos grandes conservatórios e aos grandes mestres.

Por falar no júri, não invejo sua tarefa. Eu, em casa, do conforto da minha poltrona, posso ouvir com calma, ao vivo e em replay, e julgar com a tranquilidade de quem não tem responsabilidade alguma! De qualquer forma, a subjetividade nesse tipo de concurso é altíssima, acaba sendo uma questão de gosto e de convicção pessoal, de uma maior afinidade com determinada interpretação e estilo. Acho que  o aspecto visual também tem grande influência e quase preferiria o sistema habitual em audições para orquestra, em que o candidato toca detrás de uma cortina. Mas confiemos em que os jurados, diferentemente de nós simples mortais,  não se deixem afetar por certas atitudes ou vestimentas – a tentação , no entanto, deve ser grande!

É claro que já tenho meus prediletos. Um deles, um jovem russo, caiu, para minha surpresa, já na primeira fase. Agora, uma moça coreana de quem havia gostado muito não me convenceu tanto na segunda fase. O repertório é composto de peças obrigatórias, na primeira fase dois movimentos de uma Suite de Bach, obviamente – é o Vade Mecum do violoncelista que revela muito da capacidade técnica e da maturidade do instrumentista – e de peças de livre escolha. Todos têm que tocar o Pezzo Capriccioso de Tchaikovsky, patrono do evento, obra  de extremo virtuosismo, onde se diferenciam os acrobatas dos músicos. Na segunda fase, são sonatas para violoncelo e piano e um dos dois concertos de Haydn, igualmente cavalos de batalha para o nosso instrumento.

Na semana que vem, saberemos quem, como nosso compatriota Antonio Meneses, vencedor em 1982, verá as portas das grandes salas do mundo se abrirem para sua arte. Poderemos concordar ou discordar, mas o veredito é inapelável. A discussão e a frustração são parte da graça e da paixão ligadas a esse tipo de evento, que tem, é verdade, muitos detratores. Confesso que não sou desse time e que continuo na torcida!